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O Provedor de Justiça recebeu em audiência, no dia 9 de janeiro, quatro representantes da Associação dos Proprietários de Taxis da Praia, liderados pelo presidente João Voz Antunes, que trouxeram as suas preocupações 
referentes ao recenseamento dos taxis  levado a cabo pela Camara Municipal da Praia. É que a nova lei de recenseamento traz uma alínea em que a CMP não aceita as licenças geridas por procuração, alínea essa que a associação entende ser excessiva, por entender que prejudicará várias familias de taxistas.
A associação já se reuniu com a edilidade no sentido de fazer a Câmara Municipal aceitar as licenças geridas por procuração, mas não tendo obtido resposta favoravel decidiu encetar esforços junto do Provedor de Justiça e outras entidades (Presidente da República), na procura de uma solução por via de dialogo para não se recorrer aos tribunais.

Um ano depois, o Provedor de Justiça congratula-se com as medidas adoptadas no artigo 14º do Decreto-Lei nº 1/2018, de 03 de janeiro, que torna automática (cruzamento de dados pela Administração) a prova de vida pelos beneficiários de pensões pagas pelo Tesouro, o que legitima a expectativa de que esta possibilidade venha a ser prevista em Lei que não a de execução orçamental e seja estendida a todos os cidadãos, independentemente do regime pelo qual estejam abrangidos. 

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QUE LEGALIDADE?

Desde 2014 que queixas vêm sendo apresentadas ao Provedor de Justiça e vários cidadãos residentes na cidade da Praia foram recebidos em audiência, chamando a minha atenção sobre a atuação da EMEP e o seu impacto nas condições de trabalho, de residência, de circulação e de estacionamento no centro histórico da cidade da Praia, provocado pela gestão da Zona de Estacionamento de Duração Limitada.

Queixa o cidadão residente que, inesperadamente, se desloca ao estrangeiro e no regresso vê a sua viatura bloqueada/apreendida; queixa o cidadão que vê a sua viatura bloqueada, repentinamente, por eventuais dívidas em atraso; é o cidadão que passou a pensar duas vezes antes de subir ao Platô para visitar a velha mãe que aí reside há muitos anos, porque o risco de multa é ostensivo; é o acesso ao Hospital em que agora a preocupação com a urgência da chegada tem de se somar a preocupação com o estacionamento; queixa o cidadão que precisa ir ao tribunal defender os seus direitos ao que se soma também a preocupação com o estacionamento; queixa o cidadão que estaciona em zona de terra batida, não sinalizada, e é-lhe aplicada  multa; sem contar alegações de mau atendimento. Tudo situações que alguns tenderão a subestimar, mas que reiteradas como queixas formais e informais, testemunham uma inquietação que se coloca em relação a atuação da Empresa de Mobilidade e Estacionamento da Praia-EMEP/Câmara Municipal da Praia (CMP) o que não é boa notícia para o Estado de Direito. 

A criação da EMEP tem a ver com as funções de uma cidade e, se é verdade que o grau de participação da Edilidade praiense (50%) em si mesma não a torna juridicamente responsável pelos atos de gestão daquela EMPRESA, não é menos verdade que são a Câmara Municipal da Praia e a Assembleia Municipal quem tem de responder perante os Praienses pela política e orientação geral de EMEP - nenhuma orientação prevalece sem a anuência de 50% das ações de uma empresa -  até porque, neste caso, é razoável admitir-se que a EMEP prossegue interesses e objetivos do Município da Praia. Essa responsabilidade é acrescida pelo facto de não existir uma entidade reguladora que se ocupe das atividades da EMEP.

Tais responsabilidades do Poder Local praiense têm a ver com:

-        Um Plano (de Mobilidade) elaborado pelo Município; foi solicitado este plano, mas não foi disponibilizado, o que legitima dúvidas sobre a sua existência;

-        A criação de Zonas de Estacionamento de Duração Limitada (ZEDL) tem enquadramento neste tipo de plano, quando existe, para que tal ato não seja motivado pela mera ideia de negócio, mas sim pela defesa da qualidade de vida na cidade;

-        A publicitação do contrato de concessão assinado entre a CMP e a EMEP, como previsto na Deliberação da Assembleia Municipal n.º 01/2012, de 18 de março, o que não aconteceu;

-        A fixação de um tarifário justo tem de partir de um estudo de viabilidade socioeconómica, socializado com os cidadãos e apreciado pela Assembleia Municipal enquanto representação dos munícipes, procedimentos que recomendo.

Entre outros aspetos importantes, ressalta do Estudo publicado que:

  • O Regulamento Geral de Zonas de Estacionamento de Duração Limitada (RGZEDL) é inaplicável na parte que diz respeito à fiscalização, devendo prevalecer o Código de Estradas (C.E).
  •  Os Guardas Municipais foram equiparados a agentes de autoridades, sem razão válida e legítima e não são Polícias Municipais, pelo que não têm a competência para fiscalizar o CE.
  • O IGQPI confirma a inexistência de homologação/aprovação, calibração e aferição dos modelos de parquímetros instalados e em serviço, pelo que se está diante de uma situação que consubstancia um ilícito de mera ordenação social, constituindo assim uma contraordenação nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 43/2015, de 27 de agosto, e tal processo deverá ser instruído pela Inspeção Geral de Atividades Económicas, que é a entidade competente para fiscalizar a matéria em análise.
  • O “aviso” que é colocado nos veículos pelos guardas municipais não pode ser considerado um auto de notícia, por não conter os seus elementos obrigatórios, nomeadamente o nome e a qualidade do agente da autoridade que autua, os fatos e as circunstâncias que constituem a infração, a identificação do agente da infração e, quando possível, a indicação de uma testemunha - o que consta dos “avisos” utilizados pela guarda municipal são rubricas que não permitem identificar o agente autuante.  
  • Não há sequer o início de um processo contraordenacional.
  • Ainda que se considere que o processo se inicia com o simples aviso, continua a não existir um processo contraordenacional por não se respeitarem as imposições legais referentes ao direito de defesa e por não existir uma decisão de aplicação de coima.
  • Com a aprovação da Lei n.º 13/IX/2017, de 4 de julho, a foi reconfirmada competência exclusiva da DGTR, prevista já no CE, para a instrução dos processos de contraordenações.
  • Resulta, pois, que nem a CMP, nem a EMEP têm e nunca tiveram competência para tal.  
  • A EMEP tem vindo a coagir ao pagamento de supostas coimas já prescritas, mas ainda que houvesse um processo de contraordenação, a EMEP não poderia cobrar coimas e muito menos bloquear viaturas se aquelas já estivessem prescritas conforme os artigos 34.º, 35.º e 36.º do regime jurídico das contraordenações e do artigo 159.º do CE.
  • Quanto aos bloqueamentos por dívidas em atraso, estamos perante uma ilegalidade visto que a administração, neste caso concreto, não tem o privilégio de execução prévia pois que na legislação referente a esta matéria não existe esta possibilidade de bloqueamentos para cobrança de dívidas e por isso, caso a EMEP pretenda proceder à cobrança de eventuais dívidas deverá recorrer à ação executiva para cobrança de quantia certa. 

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EMEP: CONFORMIDADE LEGAL E ADMINISTRATIVA

  SUMÁRIO

Desde 2014 que queixas vêm sendo apresentadas ao Provedor de Justiça e vários cidadãos residentes na cidade da Praia foram recebidos em audiência, chamando a atenção sobre a atuação da EMEP e o seu impacto nas condições de trabalho, de residência, de circulação e de estacionamento no centro histórico da cidade da Praia, provocado pela gestão da Zona de Estacionamento de Duração Limitada.

Queixa o cidadão residente que, inesperadamente, se desloca ao estrangeiro e no regresso vê a sua viatura bloqueada/apreendida; queixa o cidadão que vê a sua viatura bloqueada, repentinamente, por eventuais dívidas em atraso; é o cidadão que passou a pensar duas vezes antes de subir ao Platô para visitar a velha mãe que aí reside há muitos anos, porque o risco de multa é ostensivo; é o acesso ao Hospital em que agora a preocupação com a urgência da chegada tem de se somar a preocupação com o estacionamento; queixa o cidadão que precisa ir ao tribunal defender os seus direitos ao que se soma também a preocupação com o estacionamento; queixa o cidadão que estaciona em zona de terra batida, não sinalizada, e é-lhe aplicada  multa; sem contar alegações de mau atendimento. Tudo situações que alguns tenderão a subestimar, mas que reiteradas como queixas formais e informais, testemunham uma inquietação que se coloca em relação a atuação da Empresa de Mobilidade e Estacionamento da Praia-EMEP/Câmara Municipal da Praia-CMP o que não é boa notícia para o Estado de Direito. 

A criação da EMEP tem a ver com as funções de uma cidade em crescimento. Por conseguinte, se é verdade que o grau de participação (50%) em si mesma não torna a edilidade praiense juridicamente responsável pelos atos de gestão daquela EMPRESA, não é menos verdade que é a mesma edilidade quem tem de responder perante os Praienses pela política e orientação geral de EMEP: nenhuma orientação prevalece sem a anuência de 50% das ações de uma empresa, até porque, neste caso, é razoável admitir-se que a EMEP prossegue interesses e objetivos do Município da Praia.

Depois de duas recomendações do Provedor de Justiça não acatadas pela EMEP, foi decidida a realização de um estudo, no uso dos seus poderes conferidos pelo n.º 2 do artigo 3.º do Estatuto do Provedor de Justiça, que visa fazer o cotejo entre a adequação da atividade administrativa daquela empresa municipal e a legislação aplicável, tendo em conta os direitos e interesses legítimos dos cidadãos.

O presente estudo foi desenvolvido em 3 fases, a saber:

A primeira: o levantamento de documentação e legislação relevante, bem como, a auscultação de entidades e personalidades que têm alguma intervenção nas questões que se suscitam;

A segunda: a fase estruturante, a análise fatual e jurídica das informações recolhidas;

A terceira, e última: a que deu origem à elaboração de um documento exaustivo que aqui se resume. 

Daquilo que se conseguiu apurar, o Provedor de Justiça concluiu que:

  • Não há qualquer proibição legal à participação da CMP e UCCLA como sócios da EMEP, segundo os Estatuto dos Municípios, Lei Quadro da Descentralização, Estatuto da UCCLA, entre outros aplicáveis.
  • Não se sabe se foi assinado o contrato de concessão entre a CMP e a EMEP, como previsto na Deliberação da Assembleia Municipal n.º 01/2012, de 18 de março.
  • Os Guardas Municipais foram equiparados a agentes de autoridades, sem razão válida e legítima. Não o devendo ser, não têm a competência para fiscalizar o Código de Estrada (CE), estando-lhes, portanto, vedado o exercício de competências próprias de órgãos da Polícia Municipal.
  •  O Regulamento Geral de Zonas de Estacionamento de Duração Limitada (RGZEDL) é inaplicável, na parte que diz respeito à fiscalização, devendo prevalecer o CE.
  • A aplicação isolada do RGZEDL põe em causa as exigências constitucionais e o CE.
  • Perante a confirmação do IGQPI, da inexistência de homologação/aprovação, calibração e aferição dos modelos de parquímetros instalados e em serviço, está-se diante de uma situação que consubstancia um ilícito de mera ordenação social, constituindo assim uma contraordenação nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 43/2015, de 27 de agosto, e tal processo deverá ser instruído pela Inspeção Geral de Atividades Económicas, que é a entidade competente para fiscalizar a matéria em análise.
  • O CE atribui claramente competências ao Instituto de Estradas e às Câmaras Municipais, no que se refere às marcações rodoviárias, cabendo à DGTR a verificação da sua conformidade com a legislação aplicável, tendo sempre em conta os princípios do bom ordenamento e segurança da circulação rodoviária.
  • Não se sabe se houve algum estudo de viabilidade sócio económico para a fixação do tarifário. O mesmo é recomendável, pois, por um lado, o tarifário deve ter sempre uma base científica e, por outro lado, não existe qualquer entidade reguladora na matéria.
  • O “aviso” que é colocado nos veículos pelos guardas municipais não pode ser considerado um auto de notícia, por não conter os seus elementos obrigatórios, nomeadamente o nome e a qualidade do agente da autoridade que autua, os fatos e as circunstâncias que constituem a infração, a identificação do agente da infração e, quando possível, a indicação de uma testemunha. O que consta dos “avisos” utilizados pela guarda municipal são rubricas que não permitem identificar o agente autuante.  
  • Não há sequer o início de um processo contraordenacional.
  • Ainda que se considere que o processo se inicia com o simples aviso, continua a não existir um processo contraordenacional por não respeitar as imposições legais referentes ao direito de defesa e por não existir uma decisão de aplicação de coima.
  • A notificação, prevista no artigo 167.º do CE, não tem sido efetuada conforme a lei impõe, isto é, por contato pessoal ou mediante carta registada.
  • Com a aprovação da Lei n.º 13/IX/2017, de 4 de julho, foi reconfirmada a competência à DGTR, prevista no CE, para a instrução dos processos de contraordenações. Resulta, pois, que nem a CMP, nem a EMEP têm e nunca tiveram competência para tal.
  • A EMEP tem vindo a coagir ao pagamento de supostas coimas já prescritas, violando flagrantemente os prazos previstos no artigo 159.º do CE e o artigo 34.º do regime jurídico geral de contraordenações. Por tudo o que ficou dito acima, ainda que houvesse um processo de contraordenação, a EMEP não poderia cobrar coimas e muito menos bloquear viaturas se estas já tivessem prescritas conforme os artigos 34.º, 35.º e 36.º do regime jurídico das contraordenações.
  • Quanto aos bloqueamentos por dívidas em atraso, estamos perante uma ilegalidade visto que na legislação referente a esta matéria não existe esta possibilidade de atuação, nem a administração tem, no caso concreto, o privilégio de execução prévia.
  • Caso a EMEP pretenda proceder à cobrança de eventuais dívidas deverá recorrer à ação executiva para cobrança de quantia certa.

 

I PARTE – Atividade Administrativa e Legislação aplicável

1.INTRODUÇÃO

Continuam a chegar ao Provedor de Justiça pedidos de intervenção relativos às coimas cobradas pela Empresa de Mobilidade e Estacionamento da Praia (EMEP), bem como, questões relacionadas com a venda do dístico mensal e com o bloqueamento de viaturas.

O Provedor de Justiça já dirigiu à EMEP, duas recomendações, as quais não foram acatadas. A verdade é que em matéria de estacionamento privativo na via pública, o relacionamento entre a administração e os cidadãos num domínio tão importante como seja o da fruição, em exclusivo, de espaços de domínio público destinados ao estacionamento de viaturas, elemento indispensável à adequada organização do trânsito automóvel não tem sido pacífico.

Para a elaboração do presente documento foram solicitadas informações às seguintes entidades:

  • Ao Vereador do Urbanismo, Planeamento Territorial, Gestão dos Espaços Públicos e sistemas de Informação da Câmara Municipal da Praia;
  • Direção Geral dos Transportes Terrestres Rodoviários - DGTR;
  • Instituto de Gestão da Qualidade e da Propriedade Intelectual - IGQPI.

 

O plano de mobilidade da Cidade da Praia, solicitado ao Senhor Vereador do Urbanismo, Planeamento Territorial, Gestão dos Espaços Públicos e sistemas de Informação da Câmara Municipal da Praia não foi disponibilizado pelo que, não é possível aferir se por um lado foram diagnosticadas as principais debilidades do atual sistema de transportes da cidade e, por outro, se foram definidas medidas com vista à melhoria da mobilidade e da qualidade de vida em toda a cidade, com especial atenção para os residentes e população trabalhadora prevendo para estes últimos os parques de estacionamento periféricos ou zonas de estacionamento não pago, com a garantia de meios de deslocação para o centro da cidade. 

No uso dos poderes conferidos ao Provedor de Justiça pelo n.º 2 do artigo 3.º do Estatuto do Provedor de Justiça (Lei n.º 29/2003, de 4 de agosto), foi decidida a realização de um estudo que visa fazer o cotejo entre a adequação da atividade administrativa e a legislação aplicável, tendo em conta os direitos e interesses legítimos dos cidadãos.

2.A EMEP, SA – RELAÇÃO COM A CÂMARA MUNICIPAL DA PRAIA

A deliberação n.º 1/2012, de 16 de março, autoriza a Câmara Municipal da Praia (CMP) a participar na criação da EMEP e concede à mesma a exploração de parques de estacionamento municipais. Essa concessão engloba a fiscalização do cumprimento das disposições relativas ao estacionamento público.

A EMEP foi constituída com a participação da CMP, através da deliberação n.º 1/2012, de 16 de março (alterada pelas deliberações n.ºs 08/2012 e n.º 13/2012) emanadas da Assembleia Municipal e do n.º 2 do artigo 81.º da Lei n.º 134/IV/95, de 3 de julho, que aprovou os Estatutos dos Municípios. Esta Empresa Municipal apresenta-se como uma sociedade comercial, com o capital social de 3.300.000$00 (três milhões e trezentos mil escudos), prevendo-se a realização de 50% do capital pelo Município da Praia e os restantes 50% pela UCCLA (União das Capitais Luso-Afro-Américo-Asiáticas) e tem como objeto social a gestão do sistema global de mobilidade, acessibilidade, estacionamento e, serviços associados, designadamente, a exploração direta de parques de estacionamento ou contratação com terceiros para a sua exploração, construção, gestão, manutenção e vigilância de locais de estacionamento público. Ou seja, o seu objeto social encontra-se dentro do âmbito das atribuições municipais, de modo a dar continuidade às atribuições da CMP, através da gestão da concessão.

A CMP comprometeu-se a realizar a sua participação em numerário, através da dedução dos valores da prestação anual, fixada no contrato de superfície, e, através da cedência à EMEP de um terreno onde seria construído um parque de estacionamento em silos. Para tal, entre a CMP e a EMEP ficou o compromisso da assinatura de um contrato de concessão[1].

A EMEP, SA foi constituída como sociedade comercial anónima segundo extrato da publicação de sociedade n.º 82/2013 da conservatória dos registos predial, comercial e automóvel, publicado no B.O n.º 14, II série, de 8 de março de 2013.

Assim, o seu capital social divide-se em ações que devem ser subscritas por sócios, sendo o mínimo de dois para a sua constituição (artigo 342.º do Código das Empresas Comerciais e Registo de Firmas, aprovado pelo Decreto-legislativo n.º 3/99, de 29 de março). Posto isto, nada obsta a que instituições públicas ou outras possam subscrever ações de sociedades anónimas, constituindo-se, portanto, como seus sócios. Aliás, é esse entendimento assente e prática pacífica a nível mundial[2]. Neste sentido, a alínea i), n.º 2, do artigo 81.º do Estatuto dos Municípios, aprovado pela Lei n.º 134/IV/95, de 3 de julho, estabelece a competência da Assembleia Municipal para "conceder autonomia a serviços e autorizar a criação de empresas municipais, bem como a participar em sociedade de capitais públicos e em outra empresas".

Pela letra do artigo percebe-se, sem muita margem para dúvida, que os municípios podem ter participações em empresas privadas, desde que sejam sempre acautelados o interesse público e o bem comum. Em conclusão, a questão que se coloca não é tanto sobre a legalidade da criação ou participação do município da Praia na EMEP, podendo sim ser, a todo o tempo, sujeito a avaliação o exercício dessa participação.

Dito de outro modo, o que interessa a cada momento é aferir se a prossecução do interesse público é assegurada.

Por sua vez, também não se encontra na lei qualquer impedimento à participação da UCCLA na EMEP. Não a proíbe o Código das Empresas Comerciais nem os próprios estatutos da UCCLA.

Podemos entender a presença da UCCLA na EMEP como forma de cooperação com o Município da Praia. Pois bem, quer a lei-quadro da descentralização, aprovada pela Lei n.º 69/VII/2010, de 16 de agosto, que consagra na sua alínea n), n.º 1 do artigo 18.º a atribuição das autarquias locais no que respeita à cooperação internacional descentralizada, concretizando mais adiante na alínea o) do n.º 3 do mesmo artigo a possibilidade de cooperação e geminação com autarquias ou organizações estrangeiras, quer os próprios Estatutos da UCCLA (ver artigo 3.º, 4.º alínea b) e e) que faz parte integrante do Decreto-Lei n.º 40/95, de 24 de julho,) conferem tal possibilidade.

Ora, a UCCLA integra o conceito de organizações estrangeiras segundo o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 40/95, de 24 de julho, que reconhece a associação como uma organização internacional não governamental (ONG). Também no artigo 22.º, n.º 2 da lei quadro da descentralização (LQD) encontra-se consagrada a possibilidade de constituição de consórcios públicos entre as autarquias e outras entidades públicas. Ora, o artigo 3.º do Estatuto da UCCLA, diz-nos que "A UCCLA é declarada, para todos os efeitos legais, pessoa coletiva de utilidade pública geral."

Mais adiante, no n.º 4 do artigo 37.º da LQD consagra a possibilidade de estabelecimento de "parcerias público-privadas com sociedades comerciais (…) associações públicas e organizações não governamentais para projetos de investimentos …".

Por outro lado, podemos também entender a participação da UCCLA como livre exercício do direito à constituição ou participação em sociedades comerciais, o que aliás deriva dos princípios constitucionais da autonomia privada e livre iniciativa económica.

Donde, não se vislumbra, à semelhança do anteriormente dito em relação à participação da CMP, qualquer proibição legal à constituição da UCCLA como sócio da EMEP, havendo pelo contrário não só previsão legal que a permite, como parece claro que a própria lei a incentiva, conforme os artigos citados.

Segundo responsáveis, quer da CMP quer da EMEP, a autarquia tem contribuído, de forma informal na EMEP através do “empréstimo”[3] dos guardas municipais para o exercício da ação fiscalizadora. Na verdade, objetivamente, os guardas municipais não estão adstritos, durante a sua jornada de trabalho, apenas às tarefas funcionais da EMEP, executando, cumulativamente, tarefas inerentes às atribuições da Câmara Municipal, designadamente, a fiscalização do cumprimento das posturas municipais. Deste modo, a CMP acaba por ter um retorno patrimonial porque participa, enquanto sócio da EMEP, nos lucros desta empresa. Justificando-se assim, as tarefas serem executadas pela guarda municipal.

Face ao que ficou exposto e ao legalmente previsto, como abaixo se verá, a utilização da palavra “empréstimo” terá sido um lapso. Senão vejamos:

Pese embora, mais à frente venha a ser contestado, o certo é que, segundo o artigo 41.º do RGZEDL, a competência para fiscalizar (autuar e bloquear) o cumprimento das normas do código da estrada, designadamente as relativas ao estacionamento, é da guarda municipal. Aliás, o artigo 40.º equipara os agentes da guarda municipal a agentes de autoridade, pelo que de acordo com o referido regulamento só a guarda municipal poderia ter tais competências.

Conclui-se assim, que à EMEP cabe, apenas, a gestão, exploração, manutenção e vigilância das zonas de estacionamento, sem poderes, portanto, para aplicação de coimas ou remoção de veículos. Por isso, não podem ser os funcionários da EMEP, mas sim os agentes da guarda municipal a procederem às ações acima descritas, não estando, contudo, vedada a possibilidade de delegação ou atribuição desses poderes de autoridade à EMEP (artigo 41.º do RGZEDL).

 

3. COMPETÊNCIAS PARA FISCALIZAR E AUTUAR   

No que ao assunto diz respeito, o Decreto-Legislativo n.º 4/2005, de 26 de setembro, alterado pelo Decreto-Legislativo n.º 1/2007, de 11 de maio que aprova o Código da Estrada, doravante CE, estabelece, no seu artigo 7º (que abaixo se transcreve na parte que interessa), que a fiscalização do cumprimento das disposições do CE é incumbência de autoridade policial ou agentes de autoridade.

Estabelece aquele normativo que:

“ 1. A fiscalização do cumprimento das disposições do CE e legislação complementar incumbe:

a)      À Direcção-Geral dos Transportes Rodoviários, por intermédio do seu pessoal técnico ou da polícia, em todas as vias públicas;

b)      À Polícia de Ordem Pública;

c)      Ao Instituto de Estradas, nas vias públicas sob a sua jurisdição;

d)      Às Câmaras Municipais, nas vias públicas sob a respetiva jurisdição.

2. A competência referida nas alíneas a) e c) do número anterior é exercida através do pessoal de fiscalização designado para o efeito e que, como tal, seja considerado ou equiparado a autoridade ou seu agente.

3. A competência referida na alínea d) do nº 1 é exercida também através das polícias municipais, quando existam.

4. Cabe à Direcção-Geral dos Transportes Rodoviários promover a uniformização dos modos e critérios e coordenar o exercício da fiscalização do trânsito expedindo, para o efeito, as necessárias instruções.

5. Cabe ainda à Direcção-Geral dos Transportes Rodoviários aprovar o uso de quaisquer aparelhos ou instrumentos na fiscalização do trânsito.

6. As entidades fiscalizadoras do trânsito devem remeter à Direcção-Geral dos Transportes Rodoviários cópia das participações de acidente de que tomem conhecimento, sempre que lhes seja solicitado.”

Com efeito, resulta da norma em apreço que são agentes de autoridade a Polícia de Ordem Pública, a Polícia Municipal, os Técnicos da Direção Geral dos Transportes Rodoviários (DGTR) ou do Instituto de Estradas (IE), sendo estes últimos equiparados, pelo próprio legislador rodoviário, a agentes de autoridade.

Na verdade, tal previsão deriva do fato de a atuação das autoridades, no geral, poder implicar o exercício de um poder que restringe um direito subjetivo, garantido sob a forma de execução prévia, designadamente, apreensão de viaturas, de documentos de identificação e das viaturas, bloqueamentos de viaturas e detenção de infratores, quando cabível. 

Ora, o nosso CE foi inspirado no CE Europeu, conforme facilmente se comprova pelo seu texto preambular, cujo o extrato se transcreve -“Procura-se deste modo, inspirando-se no Direito Comparado e nos Códigos da Estrada recentes dos países da EU, por razões óbvias, particularmente, de Portugal, garantir a identificação dos infractores e estabelecer-se uma presunção legal de notificação pessoal no domicílio do arguido, para depois de cumpridos os princípios de contradição e de formalização da culpa, sancionar o prevaricador conforme a natureza da contra ordenação praticada, levadas que sejam em consideração as circunstâncias dirimentes e agravantes”.(sublinhado nosso).

Assim, ao nível das Câmaras Municipais a competência de fiscalização rodoviária, tal qual ao nível Europeu, é atribuída à Polícia Municipal, conforme o n.º 3 do artigo 7º do CE.

A Polícia Municipal é um órgão constitucionalmente consagrado, vocacionada para o exercício de funções de polícia administrativa, cujo estatuto e a forma de criação são estabelecidos por lei, - artigo 244º, n.º 4 da Constituição da República de Cabo Verde, doravante CRCV.

Resulta assim que, à luz da CRCV, a forma de criação da Polícia Municipal é matéria reservada à lei (no sentido formal). E, igualmente, o seu Estatuto deve ser definido por lei.

Tanto assim é que, a Lei n.º 13/IX/2017, de 04 de julho, para o que aqui importa, veio equiparar a Polícia Municipal a agente de autoridade administrativa para exercício das suas funções de fiscalização que, no âmbito autárquico, está incumbida de fiscalizar o estacionamento de duração limitada na via pública, cabendo-lhe o levantamento de autos de notícia, previsto no CE, e proceder às notificações também ali previstas.

É inquestionável que a Polícia Municipal não se confunde com a Guarda Municipal. Desde logo, porque a Polícia Municipal é um órgão legal e constitucionalmente consagrado, ao passo que a Guarda Municipal não tem qualquer enquadramento legal na nossa ordem jurídica, conforme abaixo será demonstrado.

Se é verdade que, em consonância com a CRCV, máxime o artigo 244º, n. º4, o regime, a forma de criação e o estatuto da Polícia Municipal foram legalmente definidos, através da Lei n.º 13/IX/2017, de 04 de julho, não é menos verdade que, no texto preambular da Deliberação n.º 21/2009, de 22 de junho, que cria a Guarda Municipal, ficou evidente (e dito) que a Guarda Municipal é “apenas um passo” para a criação da Polícia Municipal. Ou seja, conforme se depreende do já citado texto preambular, pretendeu-se que a Guarda Municipal, fosse “um modelo simples ou simplificado da Polícia Municipal.” (sublinhado nosso).

Tanto assim é que, a Lei n.º 13/IX/2017, de 04 de julho, no seu artigo 62º, estabelece mecanismos excecionais de transição dos agentes de guarda municipal para agentes de polícia municipal,  - os agentes da guarda municipal, providos à data de entrada em vigor dessa lei, habilitados com 12º ano de escolaridade, poderão ser admitidos no curso de ingresso para agente da 2ª classe da Polícia Municipal, desde que possuam robustez física e relatório médico favorável em exame psicológico…” (sublinhado nosso). Isso demonstra que, o perfil e as técnicas funcionais e operativas da Guarda e Polícia Municipais são diferentes.

Aliás, se compararmos o perfil de ingresso nos cargos de pessoal da guarda municipal e polícia municipal havemos de concluir que para este último há uma maior exigência técnica, psicológica e comportamental. Se para a polícia municipal, tal qual para a polícia nacional, os exames médicos e psicológicos, as provas escrita e física são obrigatórias (n.º 4 do artigo 47.º da lei acima referida e o artigo 11.º do Decreto-Regulamentar n.º 5-B/98, de 16 de novembro alterado pelo Decreto-Lei n.º 57/2006, de 4 de dezembro) já para a guarda municipal o preenchimento desses requisitos é facultativo (n.º 2 do artigo 45.º da deliberação n.º 21/2009, de 22 de junho).

Por outro lado, a deliberação que cria a Guarda Municipal socorre-se, disfarçadamente, no “preâmbulo” do regulamento do serviço da guarda municipal do município da Praia, ao invocar normas habilitantes referentes à Polícia Municipal, designadamente o artigo 240º, n.º 4 da CRCV e o artigo 43º do Estatuto dos Municípios. Isto demonstra, inequivocamente, que a Guarda Municipal é uma “figura” à margem da nossa realidade jurídico-administrativa, representando uma colisão frontal ao princípio da legalidade que informa a atuação dos órgãos públicos, segundo o qual a lei deve ser o limite e fundamento da ação e atividade administrativa.

Em segundo lugar, nos termos do CE (artigo 7º) e lei n.º 13/IX/2017, de 04 de julho (artigo 20º), a Polícia Municipal é agente de autoridade competindo-lhe, designadamente fiscalizar o trânsito. Se analisarmos a sucessão das leis no tempo, verificamos relativamente à guarda municipal que:

  • O artigo 7.º do CE atribui competências para fiscalizar as suas disposições, designadamente no que respeita ao estacionamento condicionado a pagamento (n.º 2 do artigo 69.º do CE), não referindo em momento nenhum a guarda municipal;
  • a deliberação municipal n.º 21/2009, de 22 de junho, aprova o regulamento do serviço da guarda municipal do município da Praia, atribuindo-lhe competências para fiscalizar o estacionamento de veículos, bem como, o poder de bloquear e remover veículos em situação de estacionamento indevido e abusivo, nos exatos termos regulados pelo CE. Tal deliberação contraria claramente o CE (Decreto-Legislativo) que, repita-se, em momento nenhum atribui tais competências à guarda municipal;
  • Embora a epígrafe do artigo 31.º da acima citada deliberação seja “poderes de autoridade” não estão expressos poderes de autoridade, tanto assim é que o n.º 3 do artigo 3.º da mesma deliberação refere-se que a guarda municipal recorrerá à Polícia de Ordem Pública para fazer cumprir as suas decisões, o que demonstra que a guarda municipal não tem poder de autoridade;
  • Através da deliberação municipal n.º 8/2013, de 31 de janeiro, insiste-se, indevidamente, em manter como competência da guarda municipal a fiscalização de estacionamento de veículos (n.º 2 do artigo 40.º);
  • Quando se chama o decreto-lei n.º 8/2014, de 12 de fevereiro, à colação na tentativa de considerar os guardas municipais como agentes de autoridade administrativa, salvo melhor opinião, tal não acontece. O decreto-lei em análise não faz qualquer referência à guarda municipal (vide artigo 6.º), mas antes, ao pessoal das entidades autorizadas no, âmbito autárquico, de fiscalizar o cumprimento das normas de estacionamento nos parques e/ou zonas de estacionamento de duração limitada, devidamente delimitados e sinalizados como tais, o que conforme já foi dito e nos termos do artigo 7.º do CE compete à Polícia Municipal;
  • Finalmente, ao encontro da tese aqui defendida, a lei n.º 13/IX/2017, de 4 de julho, veio regular de forma inequívoca a figura da Polícia Municipal, designadamente o seu estatuto, as suas atribuições, funções e competências, entre as quais, a de fiscalizar o CE, tal qual previsto no seu artigo 7.º.

Ao contrário do CE, o RGZEDL instituiu outro órgão fiscalizador, - a Guarda Municipal - imbuindo-o de poder de autoridade.

O artigo 40.º do RGZEDL consagra que: “1) sem prejuízo da competência atribuída por lei a outras entidades, a fiscalização das disposições do CE compete ao pessoal designado pela CMP e 2) Cabe à Guarda Municipal a fiscalização e, os seus agentes, são equiparados a agentes de autoridade”. (sublinhado nosso).

A lei n.º 13/IX/2017, de 04 de julho atribui à Polícia Municipal o estatuto de polícia administrativa por excelência. Por conseguinte, a Guarda Municipal possui um papel secundário, designadamente o de auxiliar a Polícia Municipal, conforme o artigo 4.º da Deliberação n.º 21/2009, de 22 de junho[4]. Por sua vez, o próprio regulamento que cria a guarda municipal, estabelece, no seu n.º 3.º do artigo 3º, que esta “deve contar com a especial colaboração da Polícia de ordem Pública, para assegurar o cumprimento das suas decisões.” (sublinhado nosso). Se assim é, a Guarda Municipal não é autoridade.

Ora, o CE estabelece, de forma expressa e taxativa quem são os agentes fiscalizadores, não sendo aceitável que outros instrumentos legais ou regulamentares de hierarquia inferior àquele venham propor outros agentes fiscalizadores.

Assim, o RGZEDL, aprovado em 2013, no limite das suas competências objetivas e subjetivas, devia dar cumprimento aos princípios da ordem jurídica, dentro do espírito do CE, designadamente quanto às competências de fiscalização.

Todavia, confrontado o acima transcrito artigo 40º do RGZEDL com o aqui igualmente reproduzido artigo 7º do Decreto-legislativo que aprova o CE, facilmente se conclui pela sua contradição, quanto ao órgão fiscalizador.

Conclui-se pela discrepância de conteúdo entre os dois preceitos, - o de regulação e fiscalização do trânsito rodoviário - que tratam a mesma matéria, levanta-se a questão, face a uma situação que reclama a sua aplicação, de saber qual a regra a ser aplicada?

Para tanto, não obstante as divergências, socorrendo-nos dos elementos da interpretação é possível a opção pela norma a se aplicar. Porquanto, qualquer preceito legal ou o regime no qual está inserido têm uma letra e um espírito, daí falar-se em elementos gramatical e lógico da interpretação da norma ou do regime.

O elemento lógico compreende a teleologia, a sistemática e história do preceito. Assim é, dado que todo preceito legal tem uma razão de ser, insere-se numa unidade (referida ao sistema jurídico) e tem por trás dados e circunstâncias históricas que rodeiam o seu aparecimento.

Na situação em concreto, temos que o RGZEDL se encontra inserido no sistema relativo ao trânsito rodoviário, pelo que deve estar em consonância com os princípios base dessa ordem jurídica, designadamente com o CE.

Em matéria de fiscalização do CE, o regime base é o próprio CE que, para o efeito, estabelece o perfil mínimo dos agentes fiscalizadores.

Nota-se que embora o CE tenha orientado no sentido de se descentralizar a fiscalização do trânsito rodoviário, pugnou pela manutenção de um padrão de conduta no relacionamento com intervenientes rodoviários. Essa conduta é corporizada por um agente de autoridade, com dispensa de qualquer outro.

Por tudo isto, facilmente se conclui que o RGZEDL violou toda a sistemática do trânsito rodoviário prevista no CE, quanto à fiscalização do cumprimento das suas disposições, porquanto a Guarda Municipal não se confunde com a Polícia Municipal, como pretendeu o citado regulamento, bem como, a deliberação n.º 21/2009, de 22 de junho, que aprova o Estatuto da Guarda Municipal.

Com efeito, sendo de hierarquia superior e uma lei especial, o CE prevalece sobre qualquer disposição legal ou regulamentar que o desenvolve ou contraria.

  Se assim é, urge adequar o estatuído no RGZEDL quanto à fiscalização do trânsito, face ao estatuído no CE, este sim consentâneo com as legislações rodoviárias vigentes.

Em outros termos, pelo fato de o RGZEDL ser contrário ao CE, pode suscitar dúvidas quanto a sua constitucionalidade, face ao previsto nos artigos 264º, n.º 5 e 235º, ambos, da CRCV, estabelecendo respetivamente que:  “Os regulamentos devem indicar expressamente a lei que têm em vista regulamentar ou que definem a competência objectiva ou subjectiva para a sua produção” e “As autarquias locais gozam de poder regulamentar próprio, nos limites da Constituição, das leis e dos regulamentos emanados das autarquias de grau superior ou das autoridades com poder tutelar”. (sublinhado nosso).

No caso, embora o RGZEDL pretendeu regulamentar o CE, extravasou a sua competência objetiva, porquanto não tinha legitimidade para criar outro órgão fiscalizador que não tenha sido previsto no CE. Na verdade, segundo o n.º 2 do artigo 18.º do CE “os regulamentos municipais que visem disciplinar o trânsito de veículos e peões nas vias da sua jurisdição só podem conter disposições susceptíveis de sinalização nos termos do código da estrada e legislação complementar.”

Se assim for considerado, a atuação da EMEP, através dos Guardas Municipais é ilegal, na medida em que, para além de usurpar as competências legalmente reservadas à Polícia Municipal, está assente num regulamento de duvidosa constitucionalidade.

É de se afastar a equiparação dos Guardas Municipais a agentes de autoridade, através de um regulamento municipal, pelo simples fato de não existir competências subjetiva e objetiva para o fazer.

A atribuição do estatuto de agente de autoridade, dotado dos poderes que o regulamento municipal pretende atribuir aos guardas municipais, é matéria reservada à lei e nunca a um regulamento, conforme prevê o artigo 244.º da CRCV, - As medidas de polícia são as previstas na lei, obedecem aos princípios da legalidade, da necessidade, da adequação e da proporcionalidade e são utilizadas com respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, - e o artigo 43.º da lei n.º 134/IV/95, de 3 de julho. Por outro lado, à luz da alínea a) do n.º 1 do artigo 177.º da CRCV compete à Assembleia Nacional, salvo autorização legislativa, legislar sobre direitos, liberdades e garantias. Sucede, pois, que não podem os direitos, liberdades e garantias legal e constitucionalmente consagrados (ex: direito à livre circulação) e bens jurídicos tutelados (ex: propriedade privada) serem limitados por regulamentos municipais! 

O RGZEDL e outros instrumentos legais de hierarquia inferior ao Decreto -legislativo que aprova o CE, em obediência ao princípio da legalidade da atividade administrativa, não o podem contrariar. Estes devem respeito à disciplina jurídica essencial e imperativa contida na CRCV e no CE.

A tese acima defendida aplica-se ao regime que cria e define critérios para a utilização de parques e zonas de estacionamento de duração limitada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 8/2014, de 12 de fevereiro, ou seja, pese embora o respetivo Decreto-lei parece querer legitimar a atuação dos agentes da administração, mesmo assim, permanece a questão relativa a hierarquia das leis, continuando assim a prevalecer o CE.

 

 4. OS EQUIPAMENTOS: PARQUÍMETROS E MARCAÇÕES/SINALIZAÇÃO RODOVIÁRIA

Em primeiro lugar cumpre referir que o parquímetro é um contador de tempo de estacionamento de veículos e que inicia o seu funcionamento pela inserção de meios de pagamento autorizado, com base numa tarifa predefinida pela entidade exploradora[5], no nosso caso a EMEP.

O controlo metrológico legal é uma atividade regulamentada pelo Estado e é destinada a promover a defesa do consumidor e garantir a qualidade de vida dos cidadãos e o bem-estar das populações, nos métodos e instrumentos de medição envolvidos em transações comerciais, operações fiscais/salariais, saúde, segurança e proteção do ambiente, com o objetivo de garantir a exatidão do resultado das medições nos limites definidos regularmente, tornando as transações mais justas e eficazes.

É através do controlo metrológico legal, que se faz a avaliação de conformidade de um instrumento de medição tendo em conta os requisitos regulamentares que lhe são aplicáveis, os quais compreendem as operações de aprovação de modelo, primeira verificação, verificação periódica e verificação extraordinária.

 

Quem coordena a metrologia é o Instituto de Gestão da Qualidade e Propriedade Intelectual (IGQPI), ao qual compete, designadamente assegurar e gerir o sistema de controlo metrológico legal dos instrumentos de medição, reconhecer entidades competentes para o exercício delegado desse controlo e coordenar a rede por elas constituída, garantindo a efetiva cobertura a nível nacional[6].

A calibração ou em outras palavras, a primeira verificação é o exame e o conjunto de operações realizados pelo IGQPI ou por empresa especializada, credenciada e certificada, destinados a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, novos ou reparados. A calibração deve cumprir obrigatoriamente os seguintes requisitos:

  • A marca da verificação deve ser aposta no ato da operação por forma a garantir a inviolabilidade do instrumento;
  • A primeira verificação é válida até 31 de dezembro, do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação em contrário.

Cada instrumento calibrado deve ter um certificado de calibração, o que é um registro de grande importância no sentido de garantir a confiabilidade dos serviços prestados.

Em termos práticos, nunca se deve utilizar um instrumento com o prazo de calibração já vencido/expirado, devendo todo o instrumento de medição ser identificado, codificado e controlado com relação à sua calibração.

A verificação periódica traduz-se num conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respetivo, e esta deve ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição, enquanto que a verificação extraordinária traduz-se num conjunto de operações destinadas a verificar se o instrumento de medição permanece nas condições regulamentares indicadas em cada caso, e essa verificação é solicitada a requerimento de qualquer interessado ou por iniciativa das entidades competentes.

Quanto à aferição, ela se traduz no ato de estabelecer a graduação de um instrumento que serve para medir, para que se possa comparar este com as medidas de um instrumento padrão. Portanto, a aferição é a verificação de um instrumento já calibrado, consistindo na sua comparação, apreciação ou confrontação com a medida de um instrumento padrão.  Esta aferição pode ser necessária ou não, dependendo da criticidade do equipamento.

A aprovação de modelo consiste no ato que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria, e esta aprovação deve ser requerida pelo respetivo fabricante ou mandatário e quando estes não existem no território nacional pelo importador.

De acordo com informações prestadas pelo IGQPI, entidade competente para proceder à aprovação de modelos de instrumentos de medição e à aprovação e verificação dos meios de medição[7], os parâmetros da utilização dos parquímetros são fixados por regulamentos internacionais ou organizações internacionais, competindo ao IGQPI, o controlo da sua utilização.

Com efeito, importa saber do cumprimento das exigências metrológicas dos instrumentos de medição instalados e em serviço, sob a responsabilidade da Empresa de Mobilidade e Estacionamento da Praia - EMEP.

Dessa forma, para que a Provedoria de Justiça pudesse certificar se essas questões, mormente, a da calibração, verificação e aferição dos parquímetros, foram tidas em consideração, solicitou-se ao IGQPI, através da nota N/Refª: n.º 248/ProvJust/2017 informações sobre a homologação dos parquímetros instalados pela EMEP e a regularidade da aferição e calibração dos mesmos, tendo o IGQPI informado através da nota N/Refº 786/IGQPI/2017, o seguinte:

  1. Os modelos de parquímetros instalados e em serviço, não estão aprovados (homologados) e nem foram sujeitos a primeira verificação, conforme preconiza o artigo n.º 6 do Decreto-Lei n.º 43/2015, de 27 de agosto, pelo que, a presente situação constitui, à priori, uma contraordenação, nos termos do artigo n.º 17 do mesmo diploma;
  2. Nos termos do Decreto-Lei referido na alínea anterior, os instrumentos de medição sujeitos ao controlo metrológico (neste caso, parquímetros), deverão ser verificados periodicamente por solicitação do proprietário ao IGQPI ou a outra entidade delegada por este. Não obstante essa imposição legal, a EMEP, não tem solicitado o pedido de controlo metrológico legal nos termos da legislação nacional do controlo metrológico e nem foi solicitado o reconhecimento de qualquer prática que visa o cumprimento das exigências metrológicas feita por terceiros.

 

Neste domínio, segundo os ns.º 1 e 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei nº 43/2015, de 27 de agosto, a fiscalização do controlo metrológico compete à Inspeção Geral das Atividades Económicas (IGAE) e, havendo incumprimento das exigências metrológicas, a IGAE ou outras entidades fiscalizadoras a quem devem ser enviados os autos de notícia relativos a infrações verificadas, deve instruir processos de contraordenação.

No que diz respeito à das vias públicas, ela é da competência do Instituto de Estradas e das Câmaras Municipais, nas vias públicas sob a respetiva jurisdição. A verificação da sua conformidade em relação à legislação aplicável deve ter em consideração sempre os princípios do bom ordenamento e segurança da circulação rodoviária, cabendo à DGTR essa aferição.

Com efeito, cabe à DGTR verificar e, caso necessário, recomendar às entidades acima referidas a proceder às correções consideradas necessárias, bem como, a colocação da sinalização que considere conveniente[8].

Resulta, pois, que as marcações rodoviárias devem ser homologadas pela DGTR, não tendo as Câmaras Municipais e a EMEP tal competência.

Foi, na verdade, socorrendo-se de tal competência que a DGTR, já em meados de junho de 2013[9], com base no n.º 4 do artigo 7.º e n.º 2 do artigo 8.º do Decreto-Legislativo n.º 4/2005 de 26 de setembro alterado pelo Decreto-Legislativo n.º 1/2007, de 11 de maio, que aprova o CE[10], notificou a Câmara Municipal da Praia, para proceder à correção da sinalização horizontal nas zonas de estacionamento de duração limitada, após constatar algumas irregularidades na implementação da sinalização horizontal no Plateau, contrariando os princípios de bom ordenamento e de segurança rodoviária.

Também foi recomendado/aconselhado a CMP o aumento da distância que separa o local destinado ao estacionamento, das passadeiras, depois das passagens assinaladas, a fim de facilitar a manobra de veículos, prevenindo e evitando acidentes.

No essencial, a DGTR recomendou o seguinte:

  • Ajustar as dimensões dos espaços de estacionamentos às seguintes medidas, facilitando as manobras, prevenindo e minimizando as situações de choque entre os veículos:

Dimensões

Metros

Cumprimento

4,60 metros

Largura

2,15 a 2,30 metros

 

  • Reservar lugares de estacionamentos destinados a ambulâncias, bombeiros e deficientes físicos[11];
  • Providenciar a emissão de cartões destinados a deficientes físicos que permitem a identificação de seus veículos quando estacionados nos locais a eles reservados;
  • Suspender a fiscalização do cumprimento do código da estrada e legislação complementar, por parte dos guardas municipais, até a aprovação do regulamento geral sobre a criação de zonas de estacionamentos de duração limitada.

5.  A DETERMINAÇÃO DOS TARIFÁRIOS

Neste capítulo, a questão jurídica que se coloca é a de saber se existe base legal ou científica que legitime a CMP a fixar o tarifário nos dísticos diários, mensais e semanais. 

Em relação a essa questão, somos de entendimento que a base legal para a atuação da EMEP, são as constantes: em primeiro lugar, no Regulamento de Concessão aprovado pela CMP, publicado sob o nº 82/2013, de cujo extrato de publicação de sociedade comercial, se dava conta da criação da Empresa de Mobilidade e Estacionamento da Praia, Sociedade Anónima (EMEP, SA); em segundo lugar, na Deliberação nº 8/2013, de 31 de janeiro, em cuja sede foi aprovado o RGZEDL, quando foram concedidos à EMEP tanto o direito de exploração de zonas e parques de estacionamento condicionado ao pagamento no Plateau, como o poder de fiscalizar, “o cumprimento do CE, das normas constantes de legislação complementar e dos seus regulamentos e bem assim, as Posturas Municipais todos referentes ao estacionamento público”.

No RGZEDL acima referido, estipulou-se o montante de 60$00 (sessenta escudos) por hora de estacionamento.

Desconhece-se a existência de qualquer estudo que tenha servido de base para a determinação daquele valor, e caso exista nunca foi divulgado.

Por conseguinte, é sentimento generalizado que 60$00/h (sessenta escudos por hora), pelos condicionalismos económicos e nível de vida dos citadinos, não é o tarifário justo.

Ademais, não há nenhuma entidade administrativa que regula os tarifários fixados pela EMEP. Quer isto dizer, que a empresa fixa os tarifários de forma autónoma e unilateral.

Com efeito, parece-nos recomendável promover a avaliação da viabilidade social económico do tarifário instituído pela Empresa, visando o apuramento do valor justo, amplamente socializado e divulgado.

6. O PROCESSO CONTRA ORDENACIONAL  

 

Considera-se contraordenação qualquer facto ilícito e censurável para o qual esteja prevista na lei a aplicação de uma coima, podendo ainda ser aplicável uma sanção acessória.

A coima constitui uma sanção de natureza administrativa, aplicada por autoridades administrativas, com competência para tal nos termos da lei, com o sentido dissuasor de uma advertência social, não convertível em pena de prisão e, portanto, de caráter estritamente patrimonial.  A entidade que as aplica em 1ª instância é uma entidade administrativa com competência para a fiscalização e instrução de processos de contraordenação (artigo 54.º do regime jurídico geral de contraordenações).

As contraordenações rodoviárias são factos ilícitos e censuráveis que preenchem um tipo legal correspondente à violação de normas do CE ou legislação complementar. 

Essas contraordenações estão classificadas em leves, graves e muito graves nos termos do CE. As contraordenações previstas nas alíneas c) e d), do n.º 1 do artigo 134.º do CE são consideradas leves, que ainda assim não dispensam um processo contraordenacional previsto e regulado a partir do artigo 160.º e seguintes do CE.

  6.1 Do Processo

A lei reconhece a competência da autoridade administrativa para promover o processo de contraordenações e para nele proferir em nome próprio uma decisão final que pode ser condenatória e torna-se definitiva e executória se não for judicialmente impugnada.

O agente de autoridade que no exercício da sua ação de fiscalização tomar conhecimento de uma contraordenação rodoviária aplicará a título provisório, o limite mínimo da coima prevista para essa contraordenação (n.º 1 do artigo 160.º do CE).

A competência para desencadear o processo contraordenacional cabe ao Diretor Geral dos Transportes Rodoviários, que pode ser delegada a outros funcionários, e estes últimos podem subdelegar (ns.º 2 e 3 do artigo 160.º do CE).

 

  6.2 Regras do processo (artigo 161.º a 178.º do CE)

Quando o agente de autoridade, no exercício das suas funções de fiscalização, presenciar uma contraordenação rodoviária, deve levantar auto de notícia, onde constarão os factos que constituem a infração dia, hora, local, circunstâncias em que foi cometida, nome e qualidade do agente de autoridade que a presenciou, identificação completa do agente da infração e indicação de uma testemunha, quando possível;

O auto de notícia é assinado pelo agente de autoridade ou também pelo superior hierárquico que presenciou os factos. Em caso de haver testemunhas, também deverão assiná-lo;

 Após o levantamento do auto de notícia, o arguido é notificado, por contacto pessoal ou mediante carta registada, para no prazo de 20 dias a contar do ato, apresentar a sua defesa por escrito;

 Na hipótese de haver sido efetuado pagamento voluntário, o pagamento é feito pelo valor mínimo da coima e sem o acréscimo das custas, no prazo de 20 dias a contar da notificação. No entanto, em qualquer altura, no decorrer do processo, o arguido pode decidir pelo seu pagamento voluntário o que determina o arquivamento do processo, salvo se no processo da contraordenação for, também, aplicada sanção acessória;

Quando não há pagamento voluntário e o consequente arquivamento, o processo segue os seus trâmites. Quanto à possibilidade de pagamento voluntário ser efetivado no ato de verificação da contraordenação, prevista no artigo 164.º do CE, remetemos tal questão para uma análise aprofundada posterior face a sua inaplicabilidade efetiva;

 No caso, de continuidade do processo e de não ter sido efetuado o pagamento voluntário, devem ser apreendidos os documentos originais do veículo e emitidas guias de substituição dos mesmos até à conclusão do processo. Todavia, se no momento da verificação da contraordenação o infrator tiver pendentes dívidas resultantes de processo de contraordenação, deve proceder de imediato ao seu pagamento, e em caso de não pagamento deve-se reter, de imediato, os documentos do veículo e o título de condução do infrator;

 A instrução do processo pode ser feita à revelia do arguido, contudo se o arguido estiver presente tem o direito de se fazer acompanhar de defensor;

  Com a decisão condenatória com carácter definitivo do processo contraordenacional, na fase administrativa, o arguido pode proceder ao pagamento da coima num prazo máximo de 20 dias, e se aplicada sanção acessória o seu cumprimento terá início neste mesmo prazo;

 A fase judicial, ou seja, a fase de recurso só será desencadeada caso o arguido apresente recurso da decisão administrativa condenatória, sendo este recurso mais simplificado do que o recurso ordinário em processo penal. O recurso será formulado em requerimento dirigido ao juiz do tribunal competente no prazo de 8 dias. Assim que a autoridade administrativa receba o recurso, deverá num prazo de 48h remeter os autos ao tribunal;

O recurso poderá ser aceite ou rejeitado, mediante despacho fundamentado;

Admitido o recurso, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público para realizar as diligências necessárias. A entidade administrativa pode constituir-se assistente no processo nos mesmos moldes de um processo criminal;

A decisão final deve ser fundamentada e proferida num prazo de 8 dias, onde se poderá ordenar o arquivamento do processo, absolvição do arguido, manter ou alterar a decisão proferida na instância administrativa.

 

A deliberação n.º 21/2009, de 22 de junho, que aprova o Estatuto da Guarda Municipal, na sua alínea h) do artigo 16.º, prevê que a competência no domínio dos transportes rodoviários é a prevista no CE. Tal qual o RGZEDL, nos artigos 45.º, 46.º e 47.º, no que respeita à aplicação de coimas, todo o processo contraordenacional é regido pelo CE.

No entanto, o Decreto-Lei n.º 8/2014, de 12 de fevereiro, vem contrariar o regime contraordenacional do CE, que remete para a DGTR, transferindo assim, a competência da fiscalização e instrução dos processos para a Câmara Municipal, bem como às entidades por esta autorizada, cabendo ao Presidente a aplicação das coimas.

Por fim, o regime atualmente em vigor aprovado pela Lei n.º 13/IX/2017, de 4 de julho, que aprova o regime, forma de criação, estatuto de pessoal, equipamentos e orgânica das polícias municipais, no seu artigo 9.º regula que a gestão dos processos de contraordenação compete à DGTR, cujo procedimento é o previsto no CE, sendo-lhe, subsidiariamente, aplicável o regime jurídico geral de contraordenações, aprovado pelo Decreto-Legislativo n.º 9/95, de 27 de outubro.

6.3 Da Prescrição (159.º CE)

A prescrição consiste na extinção de um direito em virtude do decurso de certo período de tempo e a verificar-se essa exceção, a mesma tem por efeito a extinção do procedimento contraordenacional.

O procedimento por contraordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contraordenação hajam decorridos os seguintes prazos:  

  1. 5 anos (cujo limite máximo da coima seja de valor igual ou superior a 200.000$00);
  2. 3 anos (cujo limite máximo da coima seja de valor igual ou superior a 100.000$00 e inferior a 200.000$00);
  3. 2 anos (nos restantes casos), conforme o caso. Ou seja, o procedimento extingue-se logo que da prática do ato tenham decorrido os prazos acima indicados tendo em conta o montante máximo da contraordenação ocorrida. 

Quanto à prescrição de coimas e sanções acessórias, estas estão previstas no artigo 34.º, 35.º e 36.º do regime jurídico das contraordenações, e prescrevem nos seguintes prazos, contados a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória:

  1. 4 anos, no caso de uma coima superior a 100.000$00;
  2. 3 anos, nos restantes casos.

 7. O USO DE BLOQUEADORES COMO MEIO DE COBRANÇA DE DÍVIDAS

Perante a situação de bloqueamento de veículos nas zonas de estacionamento de duração como meio de cobrança de dívidas é importante saber quando é que se pode bloquear viaturas em zonas de estacionamento condicionado limitado.

Antes de mais, considera-se estacionamento indevido ou abusivo, o do veículo, em zona de estacionamento condicionado ao pagamento de taxa, “quando esta não tiver sido paga ou tiverem decorrido duas horas para além do período de tempo pago, ou ainda o do veículo que permanecer em local de estacionamento limitado mais de duas horas para além do tempo permitido.”[12]

 

O CE estabelece as circunstâncias que dão origem ao bloqueamento e remoção de veículos, nomeadamente os que estiverem estacionados de forma indevida ou abusivamente[13] nas Zonas de Estacionamento Condicionado ou Limitado, nas seguintes condições:

  1. durante trinta dias ininterruptos, em local da via pública ou em parque ou zona de estacionamento isento de pagamento de qualquer taxa;
  2. em parque, quando as taxas correspondentes a cinco dias de utilização não tiverem sido pagas;
  3. em zona de estacionamento condicionado ao pagamento da taxa, quando esta não tiver sido paga ou tiverem decorrido duas horas para além do período de tempo pago;
  4. quando permanecer em local de estacionamento limitado mais de duas horas para além do período de tempo permitido.

Podem ainda ser bloqueados e removidos[14] os veículos estacionados indevida ou abusivamente nos termos do artigo acima referido, bem como os referidos nas alíneas seguintes do mesmo número.

Fora estas situações previstas nos artigos 134.º e 135.º do CE, não existe na legislação, qualquer menção ao bloqueamento de viaturas por dívidas referentes a coimas em atraso. Pelo que, não pode um veículo ser bloqueado quando regularmente estacionado e com “ticket de pagamento” válido, de forma a obrigá-lo a pagar uma dívida em atraso e, muito menos, prescrita.

Refira-se ainda que, mesmo que a EMEP considerasse que os “avisos” que são colocados nos para-brisas dos veículos, são suficientes para demonstrar a existência de um direito a uma prestação, a empresa municipal teria sempre que, através dos tribunais solicitar o pagamento da prestação em falta, uma vez que não goza, no caso, do privilégio de execução prévia, sendo que nos termos do artigo 12.º do Decreto-Legislativo n.º 15/97, de 10 de novembro, a administração pública não pode praticar nenhum ato ou operação material do qual resulte limitação de direitos subjetivos ou interesses legalmente protegido sem ter praticado previamente um ato administrativo que legitime tal atuação.

Aliás, o privilégio de execução prévia pressupõe o exercício da autoridade administrativa, que consiste em intervir nas atividades individuais suscetíveis de fazer perigar interesse gerais. No caso, não se nos afigura existir qualquer conduta perigosa dos particulares suscetível de lesar bens sociais, cuja defesa deva ser coercivamente assegurada pela administração.

Os “avisos” em causa não constituem ato administrativo definitivo e executório, por não conterem os seus elementos essenciais, a saber: a indicação da autoridade que praticou o ato, a identidade adequada dos destinatários, a fundamentação que é obrigatória no caso à luz da alínea c) do artigo 245.º da CRCV, o conteúdo e o sentido da decisão e assinatura do autor do ato (n.º 2 do artigo 9.º do Decreto-Legislativo n.º 15/97).

Por outro lado, não há notificação dos destinatários e a falta de notificação viola o artigo da CRCV acima referido.

Por fim, refira-se ainda que não é possível presumir o conhecimento oficial da notificação, uma vez que conforme já ficou dito não há qualquer procedimento administrativo em que o interessado pudesse participar, no caso não há processo contraordenacional (n.º 8 do artigo 10.º do Decreto-Legislativo n.º 15/97).

Deste modo, reiteramos o nosso entendimento de que não há prática de qualquer ato administrativo por falta dos elementos essenciais acima referidos. Ora, não havendo ato não haverá executoriedade (n.º 1 do artigo 11.º, do Decreto-Legislativo n.º 15/97).

Afastada a hipótese da existência do ato administrativo e consequentemente da sua eficácia e executoriedade, não poderá sequer ser intentada qualquer ação executiva para pagamento de quantia certa.

No caso em análise, os eventuais créditos a favor da EMEP, só podem ser cobrados através da ação executiva[15], precedida de processo contraordenacional que condene o particular, através da qual a administração requer as providências adequadas ao efetivo pagamento. Resulta, pois, que a ação executiva se destina a fazer valer direitos que envolvem o poder de exigir de outrem uma certa conduta.

O direito que se pretende fazer valer na ação executiva deve encontrar-se previamente declarado num título[16], comummente chamado de título executivo, assim, podemos concluir que a ação executiva é aquela que tem por fim efetivar coercivamente a realização de uma prestação estabelecida num título executivo ou, caso essa efetivação não seja possível, a substituição da prestação devida por um benefício equivalente, à custa do património do devedor.

Pelo que, não é lícito o recurso à força física ou à coação moral para a obtenção de direitos. Portanto, procede a afirmação de que é manifestamente ilegal, o bloqueamento de viaturas por dívidas em atraso.

Vale, no entanto, relembrar que, para que se possa recorrer ao processo executivo, o credor terá que estar munido de um título executivo, onde devem estar definidos com precisão todos os elementos essenciais da dívida, nomeadamente o montante, data de vencimento, identidade do credor e do devedor entre outros, o que, conforme já demonstrado de forma exaustiva não acontece com os “avisos” da EMEP.

8. ATUAÇÃO DA EMEP FACE À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

No âmbito dos direitos e deveres fundamentais e do princípio da legalidade, um dos mais importantes princípios que norteiam a administração pública, esta está obrigada a atuar em conformidade com a Constituição da República de Cabo Verde, doravante CRCV, e demais leis da república. Com efeito, dispõe o n.º 7 do art. 35.º da CRCV, bem como, o artigo 245.º, que em qualquer processo sancionatório, ou seja, também nos processos de contraordenação, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa, dando assim oportunidade ao arguido de se fazer ouvir pelo órgão competente sobre as provas e razões que apresenta em ordem a defender-se da acusação que lhe é movida.

O n.º 7 do artigo 35.º garante aos arguidos em quaisquer processos de natureza sancionatória os direitos de audiência e de defesa. Significa violar a Constituição a aplicação de qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido e possa defender-se das imputações que lhe são feitas. A defesa pressupõe a prévia acusação.

Dito de outro modo, a constituição proíbe absolutamente a aplicação de qualquer tipo de sanção sem que ao arguido seja garantida a possibilidade de se defender. O direito de se defender é por muitos considerado um princípio natural de qualquer tipo de processo, uma exigência fundamental do Estado de Direito. 

No processo contraordenacional, se o direito de audiência e defesa não for respeitado, quando a autoridade administrativa não realiza as diligências necessárias, todo o processo contra- ordenacional fica inquinado de nulidade insanável, invocável nos termos dos artigos 45.º do Regime Jurídico Geral das Contraordenações, n.º 7 do artigo 35.º da CRCV e 171.º do CE.

Resumindo, não pode haver decisão administrativa que aplique coima, sem um prévio processo de contraordenação.

 

II PARTE – Conclusões e Propostas

  1. CONCLUSÕES

1.1. A EMEP, SA- Relação com a Câmara Municipal da Praia

Não há qualquer proibição legal à participação da CMP e UCCLA como sócios da EMEP, segundo os Estatuto dos Municípios, Lei Quadro da Descentralização, Estatuto da UCCLA, entre outros aplicáveis.

Não se sabe se foi assinado o contrato de concessão entre a CMP e a EMEP, como previsto na Deliberação da Assembleia Municipal n.º 01/2012, de 18 de março.

 1.2. Competências para fiscalizar e autuar

Os Guardas Municipais foram equiparados a agentes de autoridades, sem razão válida e legítima. Não o podendo ser, não têm a competência para fiscalizar o CE, estando-lhes, portanto, vedado o exercício de competências próprias de órgãos da Polícia Municipal.

Pelo que ficou exposto, conclui-se pela inaplicabilidade do RGZEDL na parte que diz respeito à fiscalização, devendo prevalecer o CE.

Com efeito, a assumir-se a pura e isolada aplicação do RGZEDL, estar-se-á não só a pôr em causa exigências constitucionais, como também, a ignorar o CE.

 1.3. Os equipamentos: Parquímetros e Marcações/Sinalizações Rodoviárias

Conclui-se, pois, que perante a confirmação do IGQPI, da inexistência de homologação/aprovação, calibração e aferição dos modelos de parquímetros instalados e em serviço, está-se diante de uma situação que consubstancia um ilícito de mera ordenação social, constituindo assim uma contraordenação nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 43/2015, de 27 de agosto, e tal processo deverá ser instruído pelo IGAE, que é a entidade competente para fiscalizar a matéria em análise.

O CE atribui claramente competências ao Instituto de Estradas e às Câmaras Municipais, no que se refere às marcações rodoviárias, cabendo à DGTR a verificação da sua conformidade com a legislação aplicável, tendo sempre em conta os princípios do bom ordenamento e segurança da circulação rodoviária.

1.4. A determinação dos tarifários

Não se sabe se houve algum estudo de viabilidade socio-económico para a fixação do tarifário. O mesmo é recomendável, pois, por um lado, o tarifário deve ter sempre uma base científica e, por outro lado, não existe qualquer entidade reguladora na matéria.

 1.5. O processo contraordenacional

A grande conclusão a que se chega neste ponto é que não existe um processo contraordenacional, senão vejamos:

O “aviso” que é colocado nos veículos pelos guardas municipais não pode ser considerado um auto de notícia, por não conter os seus elementos obrigatórios, nomeadamente o nome e a qualidade do agente da autoridade que autua, os fatos e as circunstâncias que constituem a infração, a identificação do agente da infração e, quando possível, a indicação de uma testemunha. O que consta dos “avisos” utilizados pela guarda municipal são rubricas que não permitem identificar o agente autuante.  

Assim sendo, não há sequer o início de um processo contraordenacional.

Ainda que se considere que o processo se inicia com o simples aviso, continua a não existir um processo contraordenacional por não respeitar as imposições legais referentes ao direito de defesa e por não existir uma decisão de aplicação de coima.

Constata-se também que, a notificação, prevista no artigo 167.º do CE, não tem sido efetuada conforme a lei impõe, isto é, por contato pessoal ou mediante carta registada.

Conclui-se, também, que com a aprovação da Lei n.º 13/IX/2017, de 4 de julho, foi reconfirmada a competência à DGTR, prevista no CE, para a instrução dos processos de contraordenações. Resulta, pois, que nem a CMP, nem a EMEP não têm e nunca tiveram competência para tal.

 1.5.1. A prescrição

Por aquilo que se conseguiu apurar, a EMEP tem vindo a coagir ao pagamento de supostas coimas já prescritas, violando flagrantemente os prazos previstos no artigo 159.º do CE e o artigo 34.º do regime jurídico geral de contraordenações. Por tudo o que ficou dito acima, ainda que houvesse um processo de contraordenação, a EMEP não poderia cobrar coimas e muito menos bloquear viaturas se estas já tivessem prescritas conforme os artigos 34.º, 35.º e 36.º do regime jurídico das contra-ordenações.

1.6. O uso de bloqueadores como meio de cobrança de dívidas

Conclui-se que, quanto aos bloqueamentos por dívidas em atraso, estamos perante uma ilegalidade visto que na legislação referente a esta matéria não existe esta possibilidade de atuação, nem a administração tem, no caso concreto, o privilégio de execução prévia.

Assim, caso a administração pretenda proceder à cobrança de eventuais dívidas deverá recorrer à ação executiva para cobrança de quantia certa. 

 

 2.  PROPOSTAS

2.1. A EMEP, SA - Relação com a Câmara Municipal da Praia

Que se torne público o contrato de concessão, em nome do princípio da boa governação, da transparência e interesse público.

2.2. Competências para fiscalizar e autuar

 Recomendar a CMP a ajustar os regulamentos municipais e a atuação da EMEP ao CE, quanto às competências de fiscalização das suas disposições.

2.3.  Os equipamentos: Parquímetros e Marcações/Sinalizações Rodoviárias

 Em relação aos parquímetros, propomos que se inste a IGAE a proceder à fiscalização dos mesmos, nos termos da lei.

 Quanto à sinalização, sugerimos que a DGTR reitere a notificação à CMP com a determinação de um prazo para correção de sinalização rodoviária nas zonas de estacionamento de duração limitada, conforme previsto no n.º 4, do artigo 8º do CE. 

2.4. A determinação dos tarifários

Recomendar a CMP que promova a divulgação de eventual estudo feito ou, caso não haja, que promova a sua elaboração, visando a adoção de um tarifário justo. 

2.5. O processo contraordenacional

Recomendar à CMP e EMEP que suspendam os “atos de fiscalização” até que seja efetivamente criada a polícia municipal e que dê cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 9.º da lei n.º13/IX/2017, de 4 de julho, que atribui competência exclusiva à DGTR para a instrução e a decisão das contra ordenações rodoviárias, nomeadamente aplicação das coimas e sanções acessórias e enquanto não houver a materialização desta lei, a fiscalização seja garantida pelas entidades indicadas no artigo 7.º do CE, ou seja, a DGTR e a polícia de ordem pública. 

2.5.1. A prescrição

Recomendar a EMEP a cumprir os prazos da prescrição das coimas, devendo arquivar, imediatamente, os processos já prescritos.

2.6. O uso de bloqueadores como meio de cobrança de dívidas

Afigurando-se o bloqueamento de veículos por dívidas em atraso ilegal, propomos que se recomende a EMEP, no sentido de não efetuar bloqueamentos para executar dívidas em atraso sem que haja um título executivo. 

Provedoria de Justiça, dezembro de 2017


[1] Não foi possível averiguar se a participação da CMP na EMEP foi concretizada tal qual legalmente previsto.

[2] Veja-se, a título de exemplo, o caso da CVTelecom, em que o Estado participa no capital social.

[3] Memorando dos encontros realizados nas instalações da Provedoria de Justiça, onde estiveram presentes os vereadores Alberto de Mello Lima e Edna Oliveira no dia 24 de abril de 2014 e o Presidente da EMEP, Eng.º Mário Fernandes, no dia 25 de abril de 2014.

[4] A guarda municipal, tem o dever geral de cooperação com os serviços da Administração Central, especialmente com a Polícia Nacional e os serviços da polícia administrativa do Estado.

[5] Regulamento do Controlo Metrológico dos Contadores de Tempo, anexo constante da Portaria n.º 978/2009 de 1 de setembro, Diário da República, 1.ª Série – N.º 169 – 1 de setembro de 2009; Despacho n. º5266/2017 do Diário da República Portuguesa 2.ª Série – N. º114 -14 de junho de 2017.

[6] Alínea p), do artigo 4.º do Estatuto da IGQPI, Decreto-Regulamentar n.º 35/2014, de 5 de dezembro.

[7] Artigos 11.º e 12.º e alínea b) do n.º 1 do artigo 13.º do DL n.º 43/2015, de 27 de agosto.

[8] n.º 1 e 2 do artigo 8º do CE

[9] Notificação da DGTR com a referência n.º 686/DGVSR/2013, de 11 de junho dirigida ao Presidente da CMP, para correção de sinalização horizontal nas zonas de estacionamento de duração limitada.

[10] n.º 5 do artigo 7º, alínea b) e e) do nº 1 do artigo 49º, alínea c) do artigo 50º do CE.

[11]Apenas a estes foram previstos reservas de lugares no n.º 1 do artigo 14º do Decreto-Lei n.º 8/2014 que fixa as condições e utilização de parques e zonas de estacionamento de duração limitada.

[12] Alíneas c) e d) do n.º 1 do art.º 134.º do CE, conjugado com o artigo 43.º da RGZEDL.

[13] Alíneas a) a g) do n.º 1 do artigo 134.º

[14] Alínea a) do nº 1 do artigo 135º do CE.

[15] Números 1 e 3 do artigo 4º do Código de Processo Civil (CPC).

[16] Artigo 49º do CPC.

 Faça download do documento aqui Estudo sobre a EMEP

Tibunal Africano DH.NoticiasO Provedor de Justiça, António do Espírito Santo Fonseca, recebeu hoje, 14 dezembro, em visita de cortesia, uma delegação do “Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos- AfCHPR” chefiada pelo seu Presidente o Ven. Juiz Sylvian Oré, e composta pelo Vice-presidente, Ven. Juiz Bem Kioko, o Juiz Ângelo Vasco Matusse, o jurista sénior Pedro Rosa Có e três funcionários do Cartório do Tribunal.
A delegação encontra-se em  Cabo Verde em uma missão de sensibilização que faz parte dos esforços do Tribunal para interagir com as diferentes partes interessadas a fim de aprofundar a sua compreensão sobre a missão e a importância do Tribunal e incentivar os Estados Membros da União Africana (UA) a ratificarem o Protocolo que cria o AfCHPR e a depositar a Declaração nos termos do n.º 6 do art. 34.º e a permitir o acesso direto ao Tribunal por parte de ONGs e indivíduos particulares.
Até a presente data, 30 dos 55 Estados Membros da UA ratificaram o Protocolo, mas apenas oito assinaram e depositaram a declaração a reconhecer a competência do Tribunal para receber casos apresentados por ONGs e indivíduos particulares. São os casos do Benin, Burquina Faso, Côte d’Ivoire, Gana, Malawi, Mali, Tanzânia e Tunísia.
Durante essa missão de três dias, a delegação do Tribunal, para além e visitas de cortesia a várias entidades, nomeadamente o Provedor de Justiça, irá  igualmente realizar um seminário  no dia 15 de Dezembro, dedicado às partes interessadas.
Durante o encontro com o Provedor de Justiça, o Presidente do AfCHPR, o Ven. Juiz Sylvain Oré, informou ser esta, a quarta visita de sensibilização que o Tribunal realiza este ano e estes esforços prosseguirão durante o próximo ano, e solicitou a influência e advocacy do Provedor enquanto membro do Conselho da República e como defensor da justiça e da legalidade no sentido de Cabo Verde ratificar o Protocolo.
Afirmou ainda que para que o Tribunal possa atingir os seus objetivos e fortalecer ainda mais o sistema africano dos direitos humanos, é necessário que um maior número de países ratifique o Protocolo e faça a Declaração nos termos do n.º 6 do art. 34.º. O Provedor de Justiça por sua vez agradeceu a visita e comprometeu-se a usar suas funções e influência no sentido do nosso país proceder à ratificação e desta forma passar a usufruir de todos os benefícios daí advenientes.
O Tribunal Africano dos Direitos Humanos e dos Povos foi estatuído nos termos do art. 1.º do Protocolo da Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos relativo à Criação de um Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos a fim de complementar o mandato de proteção da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, com vista a reforçar a proteção dos direitos humanos no continente. É constituído por 11 Juízes, sendo 6 masculinos e 5 femininos.   
O sucesso do Tribunal como mecanismo de proteção dos direitos humanos requer uma ratificação muito mais ampla pelos Estados Membros, bem como a aceitação da competência do Tribunal através do depósito da Declaração nos termos do n.º 6 do art. 34.° do Protocolo. Esta ratificação “universal” irá conferir ao Tribunal a legitimidade de que necessita para desempenhar com eficácia o seu mandato.
Desde dezembro de 2010, o Tribunal tem vindo a promover um programa de promoção a nível continental, no âmbito do qual efetuou até então 28 visitas de sensibilização e organizou 12 conferências e seminários de âmbito regional e continental.
As visitas de sensibilização têm por principal objetivo reforçar a proteção dos direitos humanos em África. Os objetivos específicos incluem a sensibilização do público sobre o Tribunal; incentivar a ratificação do Protocolo e a apresentação da Declaração a autorizar que indivíduos particulares e ONGs tenham acesso direto ao Tribunal; consciencializar potenciais peticionários sobre como ter acesso ao Tribunal e sobre os procedimentos perante o Tribunal; incentivar o público a recorrer ao Tribunal para resolver diferendos relacionados com os direitos humanos e o recurso ao Tribunal para solicitar pareceres.